Uma mulher que matou o homem que a submeteu a anos de estupros e abusos foi condenada pelo júri, em julgamento na França, por assassinato premeditado. Mas ela não terá que passar mais tempo na cadeia.
O júri do tribunal de Chalon-sur-Saône, região central da França, deliberou por cinco horas na sexta (25) antes de rejeitar o argumento da defesa de Valerie Bacot de que ela não estava mentalmente sã no momento em que matou Daniel Polette.
Apesar de condenar Bacot por assassinato, a Justiça aplicou uma pena de prisão que pode ser totalmente abatida do período em que ela ficou provisoriamente presa. Com isso, Bacot deixou o tribunal em liberdade.
Abuso desde criança
Valerie Bacot tinha apenas 12 anos quando Daniel Polette, na época companheiro da mãe dela, começou a estuprá-la. Ele foi preso, mas depois voltou para a casa da família e supostamente retomou o abuso.
Bacot alega que Polette a forçou a se casar com ele. Eles tiveram juntos quatro filhos.
Bacot admite ter assassinado Polette em 2016, mas mais de 600 mil pessoas assinaram uma petição pedindo sua libertação.
Ela diz que atirou no marido durante um encontro em que ele a teria forçado a trabalhar como prostituta.
Bacot escondeu o corpo com a ajuda de dois de seus filhos, mas foi presa em outubro de 2017 e confessou o assassinato.
O julgamento ocupou grande espaço no noticiário na França e tem estimulado o debate público sobre a violência contra as mulheres.
O caso tem semelhanças com o de outra mulher francesa – Jacqueline Sauvage – que foi presa por matar seu marido abusivo, mas mais tarde recebeu um perdão presidencial.
Os advogados de Bacot disseram que "a violência extrema que ela sofreu por 25 anos e o medo de que sua filha fosse a próxima" a levaram a cometer o assassinato.
No mês passado, foi lançado um livro sobre a história de vida da mulher de 40 anos, no qual ela dizia que vivia "com medo o tempo todo" e "precisava dar um basta".
Bacot diz que Polette, que era 25 anos mais velho do que a mulher, começou a abusá-la sexualmente quando ela tinha apenas 12 anos.
Ele passou dois anos e meio na prisão pelas agressões na década de 1990, mas depois voltou para a casa da família e a engravidou pela primeira vez quando ela tinha 17 anos.
Bacot diz que Polette se casou com ela e tornou-se fisicamente abusivo, mais tarde forçando-a a se prostituir.
Ela admite tê-lo assassinado com a própria pistola dele, após um incidente envolvendo um cliente em março de 2016.
Os promotores argumentam que o assassinato foi premeditado, enquanto a defesa afirma que Bacot sentiu que tinha que matá-lo para proteger a si mesma e a seus filhos.
"Essas mulheres vítimas de violência não têm nenhuma proteção", disse a advogada Janine Bonaggiunta à AFP. "O judiciário ainda é muito lento, pouco reativo e muito leniente com relação aos perpetradores, que podem continuar a exercer seu poder violento."
"Isso é precisamente o que pode levar uma mulher desesperada a matar para sobreviver."
O julgamento foi realizado em Chalon-sur-Saône, na região central da França, a cerca de 165 km ao norte de Lyon.